Top 10 Livros de Cristianismo

Wanju Duli
13 min readDec 29, 2018

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Fiz minha primeira lista de livros de cristianismo em 2016. Alguns meses depois eu a atualizei. Essa é a terceira lista.

Na maior parte, contém livros de catolicismo. Porém, há vários autores protestantes ótimos, como C.S. Lewis (anglicano) e ortodoxos.

Não irei incluir aqui as biografias de santos, pois acho que elas merecem uma lista própria.

1- “Manual de Defesa da Fé”, por Peter Kreeft e Ronald K. Tacelli

Esse é meu número 1 há muito tempo. Kreeft e Tacelli são ambos professores de filosofia (além disso, Tacelli é jesuíta) e oferecem argumentos lógicos fortes (além de históricos e teológicos) em defesa do cristianismo. É desse livro a célebre passagem:

“A felicidade profunda está no espírito, não no corpo ou nos sentimentos. É como uma âncora que se mantém firme e calma no fundo, mesmo quando tempestades rugem na superfície. Deus permite tempestades físicas e emocionais para fortalecer a âncora; atira para fortalecer e testar nossa coragem. Nossas almas devem se tornar brilhantes, resistentes, espadas afiadas. Esse é nosso destino e seu projeto. Nós não somos brinquedos; somos espadas. E isso requer forja no fogo”.

Nessa obra os autores apresentam os célebres “20 argumentos em defesa da existência de Deus”. Kreeft às vezes é um pouco rigoroso em sua abordagem, então se atravessarmos essa barreira descobriremos que, por outro lado, sua filosofia é fascinante. Já li oito livros desse autor.

Esse eu li em inglês, mas posteriormente descobri que havia em português.

Gosto desse trecho também:

“Se alguém diz: ‘Eu sou perfeitamente feliz brincando com tortas de lama, ou carros esporte, ou dinheiro, ou sexo, ou poder’ nós podemos apenas perguntar: ‘Você é, realmente?’. Até mesmo o ateísta Jean-Paul Sartre admitiu que ‘chega um tempo em que nos perguntamos, até mesmo de Shakespeare, até mesmo de Beethoven ‘Isso é tudo que há?’”

2- “Todos os caminhos levam a Roma”, por Scott e Kimberly Hahn

Enquanto Peter Kreeft é mais rigoroso, Scott Hahn é um autor muito querido e por isso eu recomendo para todos que desejam uma abordagem de cristianismo mais leve. Enquanto Kreeft é mais forte na filosofia, Hahn é poderoso no aspecto teológico. Obviamente, porque Kreeft é professor de filosofia e Hahn professor de teologia.

Os dois autores eram protestantes e posteriormente se converteram ao catolicismo. Nessa obra belíssima, Hahn conta todo o seu caminho que o levou até a conversão, que começou com alguns aspectos da fé que levantavam dúvidas. Uma pesquisa mais aprofundada trouxe respostas importantes.

3- “O Banquete do Cordeiro”, por Scott Hahn

Você precisa ler esse livro. Assim que o terminei foi para a lista de melhores livros sobre catolicismo. É simplesmente espetacular!

Primeiramente falarei sobre algumas ligações entre os textos veterotestamentários com os neotestamentários.

Abel sacrificou um cordeiro para Deus e Caim deu a ele somente oferendas de frutos da terra. Deus gostou mais da oferta de Abel, provavelmente porque era um sacrifício maior, uma oferenda de sangue que representa a expiação dos pecados.

Deus mandou que Abraão oferecesse seu filho Isaac como sacrifício. Os dois subiram até o monte e Isaac carregou as toras de madeira. Isaac perguntou onde estava o cordeiro de sacrifício e Abraão disse que Deus oferecia o cordeiro quando fosse a hora. Chegando lá em cima, Isaac preparou a madeira, mas seu pai mandou que ele mesmo deitasse sobre ela. Quando estava prestes a sacrificar seu filho, o anjo o parou. Prometeu que as futuras gerações de Isaac seriam abençoadas pela fé e lealdade de Abraão.

Melquisedec, que foi sacerdote e rei, ofereceu como sacrifício não um animal, mas pão e vinho.

No Egito os judeus marcaram suas portas com o sangue de cordeiros para que seus primogênitos fossem poupados das pragas. Isso aconteceu na época da Páscoa. Deus prometeu que iria honrar essa data. E foi a época que Jesus morreu, na Páscoa judaica, bem no horário em que ocorriam os sacrifícios (três da tarde).

O Templo de Jerusalém era onde ocorriam os sacrifícios de animais, como pombas e em especial os cordeiros. Como Jesus vinha de família judaica era provável que em toda Páscoa ele e sua família participassem do sacrifício de um cordeiro e comessem sua carne.

Foi nesse mesmo Templo que Melquisedec ofereceu pão e vinho. Foi nesse Templo que Abraão ofereceu Isaac em sacrifício e o anjo o parou.

Esse Templo foi destruído em 70 d.C. pelos romanos e até então tinha ocorrido o sacrifício de 255.600 cordeiros. Mas o sacrifício de Jesus valeu mais que todos eles.

No Apocalipse Jesus é chamado de “Cordeiro” vinte e oito vezes. Ele é o Cordeiro de Deus que expia os pecados do mundo. É o cordeiro de sacrifício o qual o Velho Testamento fez tantas referências. Ele é descendente de Abraão por parte de José. Assim, Jesus se sacrificou no lugar de Isaac para honrar a profecia. Seus ossos não foram quebrados e ele bebeu vinagre na cruz pois era assim que os cordeiros eram ofertados. Assim como Isaac carregou até o morro a madeira que deveria matá-lo, Jesus carregou a própria cruz para o calvário.

A respeito da liturgia, achei essa passagem:

“Os católicos que participam todos os dias da missa ouvem, ao longo de três anos, a leitura de quase toda a Bíblia”

Livro maravilhoso! Definitivamente, um dos meus favoritos.

4 - “Cristianismo Puro e Simples”, por C.S. Lewis

Esse eu li pela primeira vez em inglês, mas depois pude lê-lo em português. É um clássico.

Saber que “As Crônicas de Nárnia”contém referências bem diretas ao cristianismo torna a leitura muito mais mágica. “Cristianismo Puro e Simples” foi um livro elaborado a partir de entrevistas que Lewis deu na rádio durante a Segunda Guerra Mundial. Em tempos difíceis como guerras, o autor nos mostra que o cristianismo faz mais sentido do que nunca. Alguns trechos:

“Quando um homem melhora, torna-se cada vez mais capaz de perceber o mal que ainda existe dentro de si”.

“Os próprios apóstolos […] deixaram sua marca na Terra justamente porque sua mente estava ocupada com o paraíso. Desde então, os cristãos têm tão extensamente deixado de pensar no outro mundo que se tornaram ineficazes neste. Mire o paraíso e você terá a Terra ‘arremessada nele’; mire a Terra e você não terá nem um nem outro”

Em algumas passagens o autor se mostra mais conservador, enquanto em outras tem insights tão profundos e sinceros que é quase mágico.

C.S. Lewis era ateu e posteriormente se converteu ao cristianismo por influência de seu amigo católico J.R.R. Tolkien. Já li seis livros sobre cristianismo escritos pelo Lewis.

5- “Ortodoxia”, por G.K. Chesterton

Outro clássico. Eis um livro admirável! Embora eu não concorde com tudo o que é dito, em compensação há passagens tão inteligentes, com argumentação tão sutil, que torna o livro, a meu ver, digno de uma leitura atenta. São argumentos muito originais e que fogem bastante do lugar-comum quando se trata de cristianismo. Como esse que é, no mínimo, intrigante:

“O novo rebelde é um cético que não acreditará, inteiramente, em coisa alguma. Falta-lhe a lealdade e, portanto, nunca poderá ser, realmente, um revolucionário. E o fato de ele duvidar de tudo atravessa-se no seu caminho sempre que denuncia alguma coisa, porque toda denúncia implica algum tipo de doutrina moral, e o revolucionário moderno duvida não só da instituição que denuncia, mas também da doutrina que o leva a essa denúncia. Assim, escreve um livro queixando-se de que a opressão imperial insulta a pureza das mulheres e, logo a seguir, escreve outro (sobre o problema sexual) no qual ele próprio insulta essa pureza. Acusa o sultão, porque as moças cristãs perdem a sua virgindade, e depois acusa a senhora Grundy porque elas as conservam. Como político, gritará que a guerra é um desperdício de vidas e, depois, como filósofo, dirá que toda vida é um desperdício de tempo. Um pessimista russo denunciará um policial por ter assassinado um camponês e depois provará, pelos mais altos e filosóficos princípios, que o mesmo camponês devia ter-se suicidado. Um homem denuncia o casamento como uma mentira e acusa, a seguir, os aristocratas libertinos por tratarem-no como tal. Chamam a bandeira de penduricalho e insurge-se, depois, contra os opressores da Polônia ou da Irlanda por que lhes tiraram tal penduricalho. O homem desta escola primeiro vai a um comício político, onde se queixa de que os escravos são tratados como animais; depois, pega o chapéu e o guarda-chuva e vai para um simpósio científico, onde prova que eles são, praticamente, animais. Em resumo: o revolucionário moderno, sendo infinitamente cético, está constantemente empenhado em minar as suas próprias minas. Num livro sobre política, ataca os homens por pisotearem a moralidade, e em outro livro sobre ética ataca a moralidade por pisotear os homens. Desta maneira, o homem moderno em estado de revolta tornou-se praticamente inútil para os propósitos da própria revolta. Revoltando-se contra tudo, perdeu o direito de se revoltar contra alguma coisa”.

Já li sete livros escritos pelo Chesterton. Vale a pena!

6- A Noite Escura da Alma, por São João da Cruz

Famoso livro de cristianismo místico. A obra é dividida em duas grandes partes: a Noite do Sentido e a Noite do Espírito.

A Noite Escura da Alma ocorre quando a pessoa para de sentir as sensações de êxtase espiritual e fica desesperado, numa espécie de crise de abstinência. Afinal, se alguém realiza uma prática puramente pelas sensações dos sentidos, por mais elevadas que elas pareçam, não poderá ficar satisfeito, pois as coisas do mundo não duram e essa pessoa não sentirá essas sensações para sempre.

Muita gente busca experiências espirituais, seja meditações, orações, danças ou outras práticas para sentir um “barato” de alterar o estado de consciência similar ao uso de drogas. No entanto, o êxtase é apenas um presente temporário para estimular a pessoa a prosseguir em seu caminho. Ela deve ser capaz de admirar o caminho espiritual por si mesmo e não pelas sensações que traz.

É isso que deve ser superado, diz São João da Cruz, para chegarmos a Deus.

O praticante encontra-se num impasse: ele largou a obsessão com os prazeres do corpo em busca dos prazeres mais refinados do êxtase com as coisas do espírito. No entanto, quando ele perde esse êxtase, ele fica sem nada: nem as coisas do corpo e nem os prazeres refinados da mente os encantam mais! Ele fica sem chão, sem nada, perdido entre dois mundos: isso é a noite escura da alma! (que, no catolicismo, é a perda da fé).

Num primeiro momento é preciso superar os prazeres que se sente com esses estados refinados da mente (ou apego à esperança da felicidade que se apoia em sensações como paz ou alegria, que não duram). Essa é a Noite do Sentido, que é equivalente a passar pelos quatro primeiros jhanas materiais do budismo Theravada e atingir os imateriais. O segundo passo é passar pela Noite do Espírito, que é quando o praticante já não se encanta tanto com os prazeres mentais refinados que sua prática lhe dá e pratica somente por amor e fé a Deus sem esperar recompensas. Ou, em termos kantianos, tendo em vista o puro cumprimento do dever pela máxima da pureza moral. Isso equivaleria no budismo a passar pelos jhanas imateriais e começar a caminhada pelas quatro etapas da iluminação.

O catolicismo chama essas etapas de “os dez degraus da escada”. O budismo chama de Sotapanna, Sakadagami, Anagami e Arahant. O estado de iluminação budista equivaleria no catolicismo a atingir o décimo degrau da escada.

Vejamos alguns trechos do livro:

“De fato, é necessário à alma permanecer neste sepulcro de obscura morte, para chegar à ressurreição espiritual que espera”.

Inclusive é usado no livro o termo “guerra da noite escura”, pois seria quase o equivalente ao combate entre Buda e Mara sob a Árvore Bodhi. Primeiro é preciso morrer para depois renascer fortalecido.

Sentir as dores da noite escura seria uma etapa necessária e indispensável no caminho espiritual. Sente-se uma sensação parecida com a morte e somente aquele que aceita essa morte poderá atravessar o abismo.

Ou seja, a existência dessa etapa não significa que o praticante está regredindo em seu caminho e sim avançando! Muita gente, ao sentir essas sensações ruins e extremamente dolorosas ao mexer com espiritualidade, recua ou até se afasta definitivamente do caminho espiritual, pois não suporta a sensação desconfortável. Porém, é necessário queimar-se nesse fogo, como se fosse um ritual de cremação para renascer para o espírito (o fogo do Espírito Santo).

Mais algumas passagens:

“Ninguém pense que, por haver nesta noite passado por tantos tormentos de angústias, dúvidas, receios e horrores, correu maior perigo de perder-se”.

“Quanto mais a alma vai às escuras e privada de suas operações naturais, tanto mais segura vai”.

“Quando assim acontece, no tempo em que o anjo bom começa a comunicar à alma a espiritual contemplação, ela não pode recolher-se no esconderijo secreto da contemplação tão depressa que não seja vista pelo demônio; e, então, ele a acomete com impressões de horror e perturbação espiritual, às vezes penosíssimas”.

“Torna-se precisa, contudo, uma observação: quando o anjo bom permite ao demônio a vantagem de atingir a alma com este espiritual terror, visa purificá-la e dispô-la, com esta vigília espiritual, para alguma festa e mercê sobrenatural que lhe quer conceder Aquele que nunca mortifica senão para dar vida, e jamais humilha senão para exaltar”.

Recomendo esse livro para quem se interessa pela operação de Abramelin.

7 - “Relatos de um Peregrino Russo”, por Anônimo do Século XIX

Assim como a maior parte dos ocidentais, descobri que esse livro existia lendo o romance “Franny e Zooey” de Salinger. Foi em junho de 2016.

A segunda vez que o li foi em fevereiro de 2017, pois a monja que me guiava num mosteiro católico de Portugal me emprestou. Nessa ocasião li também o segundo volume.

A terceira vez que li foi esse ano, pois estava com saudades dessa bela história inspiradora.

É um clássico do cristianismo ortodoxo. Conta a história de um peregrino russo que deseja aprender a “orar sem cessar” como ensina a Bíblia. Para isso ele parte numa jornada, consultando padres e outros cristãos que encontra pelo caminho, até que ele aprende o “Kyrie Eleison” (Senhor, tende piedade), oração em grego que deve ser repetida muitas vezes.

É contagiante a leitura, ao ver a grande fé, esperança e simplicidade do peregrino. As únicas posses dele são um saco de pão, sua Bíblia e um livrinho com a sabedoria de monges ortodoxos.

Ele está satisfeito em apenas caminhar por aí, viajando pelas cidades próximas, orando em solidão e conhecendo pessoas pelo caminho. É muito lindo! Ele enche nosso coração de paixão e ardor para também partirmos em nossa própria jornada espiritual.

Esse é meu trecho favorito do livro:

“O cristão não é um homem melhor do que os outros, nem mais inteligente, nem mais amoroso, ele apenas caminha com alguém, ele se mantém na sua presença”

8- Imitação de Cristo, por Tomás de Kempis

Quase me esqueci desse clássico do final da Idade Média!

A primeira vez que o li foi em inglês. Mas desde que adquiri essa edição de bolso da Editora Vozes eu o li muitas vezes.

A segunda vez foi assim que o comprei. Depois eu o li mais três vezes, cada uma delas num retiro. Nos mosteiros somos incentivados a ler enquanto comemos, então esse sempre foi meu livro para ler enquanto eu fazia as refeições na minha cela. Ele acaba rápido, então logo preciso arranjar outro livro.

É possível que eu já o tenha lido umas oito vezes. Sou fã!

Muitos santos foram fãs desse livro, como Inácio de Loyola e Santa Teresinha. Como eu costumo dizer, na época equivalia a ser um best seller do New York Times.

Como eu já o li tantas vezes, talvez devesse ser até o primeiro da minha lista. No entanto, alguns o consideram uma leitura meio pesada, já que tem uma linguagem com todo o rigor medieval, incitando a jejuns e penitências. Já li tantos livros assim que me acostumei, mas para quem não está acostumado vale a pena ler livros mais leves e de autores contemporâneos, como Scott Hahn. Ele é o autor ideal para começar. Acho que já devo ter lido uns quinze livros dele. Ele é bom assim.

9- “A experiência interior”, por Thomas Merton

“Quem é escravo de seus próprios desejos necessariamente explora os outros para pagar o tributo ao seu próprio tirano interior”

Fantástico livro sobre contemplação. Gosto muito do autor e já li outros livros dele. Recomendo até mesmo a não cristãos, pois Merton faz muitos paralelos com o misticismo cristão e o oriental.

Ele é um autor que usa uma linguagem e abordagem bem modernas, então é bem agradável de ler. Lendo Merton dá pra pensar: “Ele me entende”.

10- “Fides et ratio”, por João Paulo II

Você pode ler essa encíclica no site do Vaticano, nesse link. Mas também é possível obtê-la de forma impressa.

Nesse texto o papa mostra como precisamos das duas, fé e razão, e como ambas se aliam e se complementam, não são inimigas. Ele afirma logo no começo, com essas belas palavras:

“A fé e a razão (fides et ratio) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de O conhecer a Ele, para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio”

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Esse é só um começo. Como comentei em outros lugares, já li cerca de 300 livros de cristianismo (sem contar as releituras dos meus favoritos) e é difícil escolher só dez.

Claro que a qualidade das leituras é mais importante que a quantidade e é legal reler e estudar mais a fundo uns poucos livros que gostamos. A vantagem de buscar vários é descobrir algumas pérolas raras.

Essas foram leituras que me marcaram de alguma forma. Depende se você prefere aprender cristianismo focando nos argumentos filosóficos ou teológicos ou se prefere os autores mais místicos. Acho que é importante conhecer um pouco de cada.

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Wanju Duli
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