Sexta-feira Santa na Igreja

Wanju Duli
4 min readApr 19, 2019

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Ecce Homo (Behold the Man!), circa 1860 and circa 1880, Antonio Ciseri

A celebração da Sexta-feira Santa é um dos eventos mais belos da Igreja Católica. Ela ocorre às 3h da tarde (hora nona), horário em que, segundo a Bíblia, Jesus morreu na cruz.

Hoje fui na igreja e irei relatar tudo que aconteceu. Já cheguei sabendo mais ou menos como seria, pois lembro vividamente da cerimônia do ano passado. Mas cada ocasião é única.

A primeira coisa que chama a atenção ao entrar na igreja é ver todas as estátuas e cruzes cobertas por panos roxos. Elas são cobertas duas semanas antes da Páscoa e descobertas no dia de hoje. As únicas imagens não cobertas são as estações da Cruz.

Roxo é a cor de penitência da Quaresma, que são os 40 dias de jejum, para imitar o jejum de Jesus no deserto. O dia de quebra da Quaresma foi ontem, na Quinta-feira Santa.

https://www.catholiccompany.com/getfed/a-lenten-tradition-veiling-the-cross-6021

Vi uma mulher sentada na minha frente carregando um livro da Liturgia das Horas. Acho que é a primeira vez que vejo alguém que não é monge que reza a Liturgia das Horas. Eu mesma só faço isso nos retiros em mosteiros. Então fiquei bem impressionada!

Em todo início de missa o padre entra pela porta da igreja numa procissão, enquanto todos cantam. Porém, no dia de hoje não houve música. O padre entrou em completo silêncio. Achei poderoso!

Logo no começo da celebração, permanecemos todos ajoelhados em silêncio, por cinco minutos. Parece pouco, mas naquele instante pareceu uma eternidade. Todos unidos no silêncio para aquela ocasião solene.

A primeira leitura foi uma passagem de Isaías. A segunda, um trecho da Carta aos Hebreus. E logo seria dado início a um dos momentos mais lindos do dia de hoje.

A proclamação foi uma enorme passagem da Paixão segundo São João. Foi quase como um teatro: o padre lia as falas de Jesus, outra pessoa lia as falas de Pedro e Pilatos e um terceiro era o narrador. Para as falas da multidão, como dos sacerdotes judeus, todos nós repetíamos em conjunto.

Eu gosto muito de teatros. Meu coração já bate mais forte quando eu assisto encenações de peças de Shakespeare que eu gosto muito. E hoje eu também me emocionei ao ver declamado esse trecho tão importante, que muitos de nós já assistimos em filmes: o Getsêmani e o julgamento de Jesus.

Para mim, nesse ano foi ainda mais especial presenciar esse momento e participar dele. Afinal, no início desse ano eu conheci o jardim de Getsêmani e o local em que Jesus foi julgado por Pilatos.

Jardim de Getsêmani, local da Agonia. Foto minha: fevereiro de 2019, Jerusalém.
Pretório, onde Jesus foi julgado por Pilatos. Foto minha, fevereiro de 2019, Jerusalém.

“Crucifica-o, crucifica-o!” exclamávamos todos juntos no “teatro” da igreja. “Não temos outro rei senão César!”.

Depois que o narrador anunciou o momento da morte de Jesus, todos nos ajoelhamos e permanecemos em silêncio.

A homilia do padre foi maravilhosa. Ele disse: “Eu tenho certeza de que se eu estivesse lá na frente no dia do julgamento de Jesus, eu estaria dizendo junto com a multidão: ‘Soltem Barrabás!’”.

Depois ele também disse: “Não há ressurreição sem o sofrimento na cruz. E nós também podemos participar desse sofrimento”.

A seguir, o padre entrou pela porta central carregando a cruz coberta por um pano vermelho: a cor litúrgica de hoje, que ele também vestia. Vermelho é a cor dos mártires, para representar o sangue derramado. Todos os mártires cristãos seguiram o exemplo de Cristo, imitando-o em sua morte.

Aos poucos ele descobria a cruz, desamarrando um dos nós e entoando dizeres.

Foi feita uma fila para que cada um pudesse beijar a cruz. Após cada beijo, a cruz era limpada com um pano com álcool.

No final, houve a fila para comungar, mas não houve o sacrifício da missa como de costume.

A duração total foi 1:20. Nessa noite haverá uma procissão da Via Crucis e amanhã à noite a Vigília Pascal.

The Crucified Christ with the Virgin Mary, Saints and Angels (The Mond Crucifixion), circa 1502–1503, Raphael

Fiquei muito feliz de ter presenciado tudo isso hoje. A igreja estava cheia! É uma alegria saber que após mais de 2 mil anos continua-se a vivenciar esse momento do passado no presente.

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Wanju Duli
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