Resenha: The Abramelin Diaries, por Ramsey Dukes
Esse é o terceiro livro que leio que contém um diário da operação de Abramelin. Os outros dois foram os relatos de Georges Chevalier (William Bloom) e Marcus Katz (que fez a operação em 2004, 15 anos atrás, mesmo ano que fiz a minha primeira!). Fiz resenha deles também. Interessante que Ramsey Dukes havia lido o livro de Chevalier antes de começar a operação. Hoje em dia há outros relatos célebres disponíveis na internet, como esse de Athena W, que eu também já li.
Na época em que o Dukes fez a operação, em 1977, o único diário publicado sobre Abramelin era o de Chevalier. O primeiro que eu li foi o de Katz e foi por causa desse relato, que trouxe lágrimas aos meus olhos, que resolvi repetir a operação (atualmente estou no mês número 9).
No caso de Chevalier, ele se isolou por seis meses num local afastado no Marrocos. Mas eu não diria que o diário dele é mais emocionante por causa disso, mas que cada um dos três livros é maravilhoso de uma forma única. Esse mais antigo é um clássico de referência que geralmente vem à mente das pessoas quando se menciona Abramelin. Ainda assim, eu acho genial a existência desses outros diários mais recentes nos quais os autores mostram como é fazer a operação numa cidade grande em meio à vida normal. No caso de Dukes, é um diário sobre uma operação feita há 42 anos.
Há algumas experiências comuns vividas pela maior parte dos que fazem Abramelin, como a luta contra o sono (já que a primeira oração deve ser feita antes do nascer do sol), dificuldades com a alimentação (dieta vegetariana ou vegan e jejuns variados) e sonhos extremamente vívidos, que em parte ocorrem devido ao processo de interrupção do sono. Digamos que uma pessoa acorde às 5 horas da manhã para fazer a oração, finalize às 6h e depois durma mais 2h e acorde às 8h. Essa interrupção de sono para dormir posteriormente é um gatilho poderoso para nos fazer recordar dos sonhos, principalmente após uma oração tão forte. A probabilidade de termos sonhos com nosso anjo é muito alta. Se você deita para dormir não muito depois de fazer a oração da noite, ela também pode ser um gatilho.
Ramsey Dukes faz um relato incrível de sua enorme dedicação à operação. Ele foi extremamente rigoroso com os horários das orações e dormia pouquíssimo. Além de fazer orações longas, fazia meditações. A maior parte das atividades do dia estavam direcionadas para Abramelin. Além de fazer longas leituras da Bíblia diariamente, fazia recitações diárias de muitos salmos.
É difícil não admirar seu empenho. Depois de tirar a carne da alimentação, ele também tirou ovos e laticínios. Começou a fazer jejuns cada vez mais rigorosos, quanto mais se aproximava o grande dia, e foi perdendo cada vez mais peso. Ele fazia constantes referências aos santos que, despreocupados de sua saúde, faziam jejuns que torturavam o próprio corpo apenas para servir a Deus. Por outro lado, Dukes foi muito humilde em seu relato e bem rigoroso consigo mesmo, achando que nunca estava bom o bastante, por mais sacrifícios que fizesse.
Os diversos sonhos relatados por Dukes são uma obra de arte! Eu me diverti e ri ao ler muitos deles. Alguns foram realmente profundos e impressionantes. Provavelmente os relatos dos sonhos são uma das partes mais lindas de ler em um diário de Abramelin.
Uma dificuldade apresentada por Dukes foi o fato de ele não ter uma visão monoteísta de Deus e naquela época possuir uma crença sobre a divindade mais próxima do taoísmo. Um dos encantos da operação de Abramelin é a possibilidade de adaptarmos elementos da operação às nossas crenças espirituais. Mesmo assim, ele conta como esse quesito foi um desafio e uma experiência nova, como interpretar o papel de crente fervoroso num teatro. Pode ser o que sentem muitos ocultistas não tão integrados no paradigma judaico-cristão ou desconfortáveis com alguns de seus elementos. No entanto, conforme mostram os diários, nada disso constitui um obstáculo maior. A operação pode ser feita sem problemas apesar disso.
A primeira vez em que Ramsey Dukes teve contato com o livro de Abramelin foi quando ainda era uma criança. Desde essa época ele já desejava realizar a operação um dia. Mas esperou até seus 25 anos ou até que a oportunidade se apresentasse, que veio numa época de transição de emprego, por volta de seus 32 anos.
Ele ainda realizava várias atividades e tinha contato com algumas pessoas, mas ainda assim tentou minimizar seus contatos. Ele consultava com frequência o I Ching para pedir conselhos de como proceder a seguir.
Dukes conta como essa foi uma experiência que o transformou. Ele a considera “os seis meses mais significativos da minha vida”.
Foi um relato sincero e vívido. Eu me identifiquei com várias coisas, admirei sua humildade em confessar suas dificuldades e me impressionei com seu rigor.
Dukes fala sobre os problemas que podemos ter com expectativas. Por isso acho importante para quem faz a operação ler alguns relatos antes ou mesmo durante. Alguns podem evitá-los para não ter “spoilers”, mas como a experiência é muito única para cada um, eu acredito que vale a pena lê-los.
Os diários variam muito. Há pessoas que relatam contatos extremamente emocionantes com o anjo, cenas assustadoras com os demônios/espíritos familiares e um uso impressionante dos quadrados. Enquanto outros são mais discretos em seus relatos devido a razões diversas (incluindo ser impossibilitado de revelar algumas partes da operação).
Ao relatar o resultado de sua operação, um conhecido de Dukes o elogiou, fazendo a seguinte curiosa observação: algumas pessoas, ao realizar Abramelin, em vez de se encontrar com seu Sagrado Anjo Guardião, têm um conhecimento e conversação com seu próprio ego.
Nós geralmente queremos fazer a nossa própria vontade e não a vontade de Deus. Essa luta entre o entendimento do que devemos fazer e nossa compulsão por seguir os nossos desejos (que muitas vezes se confundem com os desejos e expectativas dos outros) é natural no processo de autoconhecimento.
Mas conhecer a si mesmo é difícil. Não é algo que conseguimos com uma única sessão de psicoterapia. A operação de Abramelin mostra o que significa se conhecer: é um processo longo, diário, doloroso e que exige sacrifícios. Não é um mero passatempo, uma distração, uma diversão ou optar pelo caminho mais fácil. Fazer Abramelin é necessariamente escolher seguir uma via árdua, mesmo quando outros caminhos mais fáceis e curtos estão disponíveis. É desafiar a si mesmo, é um processo de destruir a si mesmo e “caminhar sobre nossos egos mortos”. É abrir mão de uma das coisas mais preciosas para nós: nosso orgulho, para nos ajoelharmos diante de um Deus que hoje para muitos é apenas um mito.
Um trecho do livro de Dukes:
“Quarenta anos depois, durante o curso de preparação desse diário para publicação, eu li o ensaio de Jozef Karika sobre Choronzon e ele me trouxe memórias do significado de algumas associações. Karika sugere que o ‘SAG real’ (Sagrado Anjo Guardião) não deve ser bonzinho, mas uma ‘entidade terrível — o nada no humano, seu abismo’ e ele sugere que o confronto com Choronzon, o demônio do abismo, seria um sinal de sucesso na operação”
Sem dúvidas, uma constatação interessante. Eu diria que a própria operação já contém seus próprios confrontos e lutas demoníacas, que seria a parte dos espíritos familiares, que é o ápice e símbolo (embora com entidades reais) do que enfrentamos ao lutar contra nosso ego ao longo dos meses de renúncia, penitência e purificação.
Além disso, a própria Bíblia descreve que encontros com anjos são sempre assustadores. Um anjo, assim como o próprio Deus, não é “bonzinho”. É um ser majestoso e terrível. Misericordioso, porém justo. No livro “Angels and Demons” Peter Kreeft descreve isso com brilhantismo. Não é por acaso que literalmente cada vez que um anjo aparece na Bíblia ele precisa dizer: “não tenha medo”.
No final, Ramsey Dukes dá as seguintes dicas: se possível, tentar a versão mais longa da operação, fazê-la em isolamento e focar em práticas que treinam a imaginação. Porém, como atestam as pessoas que fizeram a versão de seis meses e sem completo isolamento, não atingir todos esses requisitos não compromete o sucesso da operação.
Cada pessoa que fizer a operação terá seus pontos fortes e fracos, como em todo o resto. Compense suas fraquezas focando em suas forças. E tenha confiança nos testemunhos dos que já fizeram a operação antes. Também é o testemunho da vida de tantos santos e pessoas devotas que fortalecem a fé e o amor de tanta gente em Deus.
No futuro irei filosofar com mais detalhes sobre aspectos da operação. Por enquanto, minha intenção era fazer a resenha desse belo livro do Dukes. Foi uma resenha simples e curta, mas a mensagem que eu queria deixar era simplesmente: leia e veja, pois eu não quero tirar a sua diversão contando mais.