Morte e Temor de Deus
O termo “temor de Deus” não é muito popular. Prefere-se falar em amor do que em temor. Um dos termos usados para temor de Deus em inglês é “awe”. Num dicionário há o seguinte significado para ele: “um sentimento de grande respeito, às vezes misturado com medo ou surpresa”.
Gosto desse significado. Temer Deus não é apenas sentir medo. É, acima de tudo, um respeito tão grandioso e complexo que se mistura com outras sensações extraordinárias. Quando aparece um anjo na Bíblia, geralmente é dito que as pessoas se jogam no chão, com o rosto em terra, “como mortos”.
“Como mortos” é uma ótima expressão, pois ver um anjo ou ter algum tipo de contato com Deus é exatamente se deparar com aquele que rege a fronteira entre vivos e mortos. Então você sente essa sensação indescritível que dá um sentido formidável para a vida.
C.S. Lewis frequentemente critica o “cristianismo água com açúcar”, que fala apenas de amor e não de morte. Que fala apenas de Deus e não do diabo. E eu acrescentaria: que fala só em amor de Deus e não do temor.
Não estamos falando aqui de um medo que paralisa as pessoas, no sentido de fazê-las se sentir mal, culpadas por seus pecados e cheias de problemas de saúde mental por causa das ameaças do inferno.
Há muitos tipos de medo. E ter medo não é sempre ruim. Se temos medo da morte é porque consideramos aquilo importante.
E o que significam essas palavras de Oswald Chambers? “Algo notável sobre Deus é que quando você o teme, não teme mais nada, enquanto se você não teme Deus, teme todo o resto”.
Não significa que pessoas que não acreditam em Deus temem mais. Até porque essas pessoas podem ter outras crenças similares, como a crença de que é certo ajudar os outros ou morrer pelos outros. Essas pessoas podem ser tão destemidas diante da morte quanto um mártir cristão ou muçulmano (ou mártir de outra religião).
Ainda assim, a crença em Deus, o respeito e o amor por ele nos dão um tipo muito especial e particular de coragem. É entender que a morte não é o fim. É entender que há um sentido para o sofrimento. Isso nos dá uma grande esperança.
Eu não ando dormindo muito ultimamente, principalmente porque ando lendo demais. Devo estar lendo uns quinze livros ao mesmo tempo, um pouco de cada por dia, além de fazer outras atividades. Por isso tenho dormido pouco, o que leva a perturbações no sono. E na última noite eu acordei novamente com medo, achando que estava morrendo, e pensei em Deus.
No último post que escrevi falei um pouco sobre isso: como tornar nossa crença automática através da oração constante. Em momentos de morte e quase morte isso não é apenas útil, mas fundamental. E também em momentos de grande dor e medo.
O medo da morte pode ser uma poderosa lembrança de Deus. É quase impossível um ser humano perder totalmente o medo da morte. Ele não pode fazer isso sozinho. Então é só confiar em Deus que ele irá arrancar esse medo, porque você irá se esvaziar de você e apenas Deus habitará nesse corpo.
Será que pessoas religiosas pensam mais na morte ou a temem mais? Devem mesmo pensar mais na morte, talvez porque inicialmente a temem mais. Mas de tanto pensar descobriram algumas coisas brilhantes que as religiões ensinam. E posteriormente já não temem tanto quanto antes.
Não pensar na morte não significa coragem. Às vezes pode ser uma fuga, por medo. Evidentemente, isso depende da pessoa. Não vou afirmar que pensar na morte faz uma pessoa melhor, pois há formas ruins de pensar nela: como se fosse um beco sem saída.
Tendo a pensar que as religiões estão certas no que falam sobre a morte: que há um mundo depois desse, que Deus existe. Não é apenas um consolo vazio. É um ensinamento que define algo real que pode ser comprovado agora no mundo, em seu coração.
Pois mesmo que Deus não existisse, mesmo que não houvesse um mundo depois desse (creio nessas duas coisas), ainda assim a religião faria muito sentido. Pois quando acreditamos em Deus e num mundo após esse, podemos ter muita coragem diante da morte e da dor. E isso é real! Essa coragem, essa força é real. E essa força imensa que emana do ser humano não pode ser meramente humana. Isso mostra Deus. Apenas a imaginação não teria esse efeito que é mais poderoso que o corpo e a mente: é espírito.
É claro que um ateu também pode ter essa coragem. Mas, como eu costumo dizer, isso não ocorre devido ao seu ateísmo, mas por outras crenças suas: acreditar na humanidade, no bem, que é correto ajudar os outros. Ele teria no mínimo algumas crenças morais.
Da mesma forma, é possível que um religioso acredite em Deus mas que suas crenças morais estejam distorcidas. Isso, é claro, é um perigo. Felizmente, é uma parcela pequena dos religiosos que pensa isso.
Sabemos que a maioria dos religiosos consegue aliar sua crença religiosa com sua crença moral, pois através da história atos religiosos de caridade sempre superaram em muito as guerras religiosas. E a combinação dessas duas (fé e moralidade), penso eu, é muito mais poderosa do que apenas a moralidade.
Não afirmo de forma absoluta que é assim. Apenas que, se pensarmos de forma lógica e com base nos testemunhos dos que vieram antes de nós, parece ser assim.
Entre ter dois motivos (o moral e o religioso) e apenas um (somente o moral) para fazer o bem e não temer tanto a morte e a dor em nome desse bem, acredito que é melhor ter dois motivos, pois um fortalece e sustenta o outro em momentos de dúvida.
Talvez Deus permita a morte e a dor como uma lembrança dele. Para que lembremos de Deus. Toda vez que penso na morte lembro de Deus. É assim que deve ser. Há uma conexão misteriosa, sagrada, quase maravilhosa. Sim, assustadora, também terrível.
É o temor e o amor. “Awe”.